Então é Natal, de 2020 :(

Então é Natal, de 2020 :(

Há alguns anos, comecei a viver um Natal incompleto. Lugares à mesa ficaram ausentes devido à partida de alguns familiares. Meu consolo era ver que havia mais gente chegando na família e os que ficaram aqui como minha força na caminhada em meio ao luto.

Mas aí veio o Natal de 2020. As famílias do mundo inteiro terão ausências. Minha ceia, que reúne as pessoas que mais amo, não acontecerá. A família foi renovada no vinte vinte, mas quem diz que conheci algum novo bebê dos Camargos? Dudinha, Matias e Eloah ainda são fotografias para mim.

Eu, amante da solitude, traduzo Natal como presença no sentido literal, com abraço, gente bêbada, piadas, presentes, entre outros clichês pintados de verde e vermelho. É a época em que faço questão da minha pequena grande aglomeração. Mas, nos meus primeiros natais sem todo mundo, comecei a procurar os ausentes em mim e nos arredores. Elas apareceram nas histórias, causos, em gestos que herdei, na aparência e faziam meu coração pulsar um pouco mais tranquilo, embora recebesse uns solavancos tristes.

Alguns vivos, como meu pai e irmãos, também estão longe. Fui pêga de surpresa por 2020, não planejávamos ficar tanto tempo sem nos ver. Não houve ressignificação que aplacasse minha tristeza.

Todos os familiares se tornaram parecidos conosco. Estamos vivos e sem a possibilidade do encontro. Se eu tentar ser otimista e falar que já encontramos um jeito de ser festa nessa confusão toda, serei a maior mentirosa da história. Agradecemos chegar ao final do ano sem perdas de vidas, porém, sabemos que tudo seria diferente sem esse vírus por aí.

Mas aprendi que há algo pior do que não ver alguém nessa minha vida de encontros e despedidas. É quando a ausência é vazia, nem sentimos falta. Se aquele post no Instagram que diz que “precisamos normalizar o Natal entre amigos, ninguém aguenta parente mais” fizer sentido, aí é que eu ficaria mal de verdade. Mesmo que a falta seja preenchida por angústia e tristeza, em alguns dias, pior seria se a distância fosse oca.

Felizmente, há dias e dias. As presenças inauguradas agora, nas videochamadas, mensagens e as formas antigas de trazer a pessoa para perto – com a memória, histórias, receitas, objetos – vêm alegres em algumas ocasiões.

Feliz ou triste eu só não quero que a ausência física da família seja um alívio… Quando a alma pede o outro, mesmo de forma sofrida, o Natal de 2020 ainda faz sentido e eu agradeço por sentir falta, conheço quem nunca viveu essa época com alegria por não gostar de onde nasceu.

E a data simboliza o surgimento da sagrada família com a chegada de Jesus para Maria e José. Pra mim, não faz sentido ser celebrado com amigos, como muitos têm pedido.

Nesse ano, o Natal me deixou triste. Mas há outro sentimento que não mudou para mim: a gratidão por minha família.

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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