Telemarketing: eles não sabem quem eu sou
Meu telefone fixo quase nunca toca. Hoje ele insistiu em chamar, uma, duas, três vezes… Nas duas primeiras, a ligação caiu imediatamente. Depois, consegui atender e descobrir que mesmo com a abolição do gerundismo alguns profissionais de telemarketing têm muito o que melhorar para tornar a ligação agradável. Eu me senti na Câmara dos Deputados, pois o funcionário faltou só me chamar de vossa excelência. Senhor e senhora, em um tom bastante apropriado foram usados o tempo todo, acho que para ninguém perceber o atendimento grosseiro.
Foi mais ou menos assim nossa conversa:
“Boa tarde, gostaria de falar com o titular da linha”
“Ele não está, sou esposa dele”
“Do senhor Aílton?”
“Não. Geraldo”
“Aí não é rua Pará, n X – Santo Antônio – Divinópolis?”
“Não, aqui é rua Bambuí”
“O titular da linha é Aílton sim, a senhora devia se informar melhor”. Foram as últimas palavras do atendente antes de desligar o telefone na minha cara.
Com o fim da ligação fiquei pensativa. O que lhe dava tanta certeza do nome do meu “marido”, titular da linha e até do meu endereço? É claro que sei todos esses dados de cor. Se o rapaz não tivesse desligado eu provavelmente diria que já que ele insistia, podia mandar a conta para o nosso vizinho desconhecido da rua Pará, pertinho da minha casa mesmo. Lembrei-me também de quando tento ligar para o Geraldo e a ligação automática do outro lado me diz que o telefone não existe. Minutos depois consigo fazer a chamada. Parece que quem tá do lado de lá sabe mais que eu, de tanta certeza que expressa.
Acredito que os atendentes, quem fica atrás de planilhas e algorítimos que são capazes de traçar perfis de potenciais clientes ficam muito frustados quando a interpretação de todos os dados mostra-se errada. Eu quase nunca digo um sim via telemarketing. Eles juram que as revistas X, Y ou Z são perfeitas para mim – erram feio na maioria dos casos.
Acho que é essa mania de acharem que as máquinas podem dizer tudo que os frustam. Subestimam o conhecimento do próprio cliente por desconfiar de dados impossíveis de errar, subestimam a inteligência deles próprios, humanos. É claro que sistemas facilitam muito nossas vidas, mas é na interpretação humana, na interação que reside o sucesso. É por isso que empresas têm investido cada vez mais em treinamentos de habilidades comportamentais. A técnica é aperfeiçoada com a repetição, já a inteligência relacional depende de cada conversa, pois nenhum homem vem com scripts, programação. É preciso tato, paciência e humilde para dizer que está errado para uma conversa entre um humano e outro dê certo.