Saudades de mim, saudades docê

Saudades de mim, saudades docê

Sinto saudades todo dia. E às vezes a falta é dupla: de mim e de você. Faz falta o que eu era contigo. É certo que você estar longe me transformou. Sabe, você deixava meu caminho mais macio. Eu tinha seu ouvido, colo e a expressão “a vida é assim mesmo” para me confortar. Só funcionava mesmo quando você falava.

Sinto saudades de ser paparicada com maçãs na geladeira, do beijo às vezes escondido quando eu cochilava. Eu sei que você me amava tanto que não conseguia manter a linha de durona, de vez em quando precisava acreditar que não tinha ninguém por perto para me dar um carinho depois da bronca. Pra te deixar à vontade eu só abria os olhos depois e segurava o sorriso. Era difícil, pois o beijo era bom. Talvez você soubesse que eu fingia, talvez…

Porém, do que eu mais sinto falta é do quanto eu era sensível perto de você, dos sentimentos que se mostravam quando estava por perto. Hoje eu nem choro tanto, pois só sua presença liberava minhas lágrimas tímidas. Minha pele, mãe, eu confesso, só era tão fina perto de você porque eu sabia que estava ali para falar que odiava me ver chorar, mas só na sua frente eu tinha coragem de expor minha fragilidade besta, sem fundamento, cheias das nove horas.

Ainda penso se eu precisava era de te ouvir falar que eu precisava ser mais forte ou se queria carinho. Eu sabia que seus conselhos vinham em palavras pouco sensíveis, mas quando eu virasse as costas já estava com o telefone na mão para me ajudar a resolver o que era prático e depois falava o que me fazia sentir melhor.

Tenho saudades de saber que eu me ajustava nas suas roupas, de nem fazer a mala direito quando eu ia te visitar. Você ficava brava, só que na hora de eu ir embora, caso achasse que a blusa tivesse ficado bonita em mim, colocava nas minhas coisas. Mãe, é só com você que eu conseguia ser tão espaçosa. Como você, eu só algo emprestado em último caso.

Tenho saudades de você me perguntar se quero dormir até tarde ou se podia me chamar . Talvez você nunca tenha percebido, porém vez ou outra eu abria os olhos mais cedo e te esperava, escutava suas conversas sobre o quanto eu estava cansada, minhas conquistas ou só os sonhos que achava bonitos. Faz falta ter uma admiradora assim.

Faz falta como eu era com você porque você era uma parte muito bonita de mim e levou o me transformava, me deixava sensível como eu nunca conseguirei ser perto de mais ninguém e a geladeira cheia de maçã. Sinto saudades de mim, sinto saudades docê.

 

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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