Dia das mães órfão

Dia das mães órfão

A proximidade de alguns períodos do ano são uma espécie de aviso prévio, uma preparação para a tristeza certa. Estranhamente, ter o Dia das Mães por perto não é um aviso prévio pra mim. Apesar de eu não ter minha mãe comigo mais, o segundo domingo de maio é diferente de todo mês de agosto, por exemplo, quando por mais que eu me esforce reviva a pior fase até hoje para mim. Volta o medo da cirurgia, da espera por notícias boas do CTI e a despedida final mais os dias que se seguiram na tentativa de entender o que havia acontecido.

Já o Dia das Mães me traz lembranças agradáveis. Mais uma vez sinto vontade de agradecer a presença da dona Neuza enquanto foi possível na Terra. Lembro que foi tempo suficiente para que eu saiba direitinho o que ela diria em momentos que preciso. Cumpriu a missão de mãe, conseguiu ensinar como eu deveria seguir. Claro, não serei hipócrita, eu gostaria era que ela falasse em carne e osso, mas me contento com o que ecoa em minha mente.

Ao remexer nas minhas lembranças fico feliz porque vejo como fiz o melhor que pude. Nós brigávamos, nossa relação era imperfeita. Mas eu sabia pedir desculpas e mostrar o quanto a amava. São muitas cartinhas nas minhas caixas que peguei de volta quando ela se foi. Nelas eu expunha meu lado, falava do meu amor e da minha vontade de que os desentendimentos acontecessem com menos frequência.

Também me declarava quando ia tudo bem. Ela quase nunca me escrevia em momentos de tensão, só que em situações importantes me enviava recadinhos encorajadores, sempre com as palavras “Eu te amo” e “saudades” no final.

Nada ficou por dizer, assim, desconheço remorso.

A data também é quando volto nas reuniões familiares com todas as mães e os parabéns para os muitos aniversariantes de maio que temos. Retorno às tentativas de fotos, somos muitos e colocar todos juntos para o clique é uma aventura das melhores. Tem gracinha pelo caminho, criança que faz birra, adulto que consegue arrancar lágrimas dos pequenos e todo tipo de confusão boa que somos capazes de criar.

Já recebi telefonemas preocupados no Dia das Māes. Compreensível, enquanto quem as tem almoça, troca presentes e mensagens eu passo o domingo com minhas lembranças dos segundos domingos de maio de anos atrás. Mas essas lembranças são doces, por isso Dia das Mães é um aviso prévio às avessas para mim, ainda é, e sempre será, um dia para agradecer por ser a filha da dona Neuza.

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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