Zé da Cruz de volta para Moeda
Zé da Cruz é um sujeito muito importante que vive lá pelas bandas de Moeda. Uma vez ele cismou em sair de lá, mas recebeu um sinal de que o lugar dele era entre as montanhas daquela serra. Na época, ele pediu que um conterrâneo dele arrumasse um serviço na capital mineira. E assim foi feito.
Caboco acostumado a lidar com a terra e serviço bruto, Zé se acostumou rapidamente com a nova empreitada, que tinha máquina para ajudar. Demonstrava toda sua força por detrás das máquinas, não deixava nada a desejar na execução das tarefas. Pensava ser um homem de sorte, ficava mais feliz ao bater ponto na entrada do que no fim do expediente. Mas Belo Horizonte começou a perder graça com uns meses na cidade. Bonita mesmo era a Moeda, circundada por terras altaneiras, riachos e cachoeiras. Porém o Zé continuou levando como dava.
Um dia, apareceu um vendedor de consórcios por lá. A conversa habilidosa despertou um desejo que Zé tinha lá no fundo, ser dono de uma moto. Ah, seria bom demais ter a bichinha para chegar na Terra Natal mais rápido no sábado e nem precisar de carona. O moedense pensou tanto nas maravilhas da motoca que foi o primeiro a ser contemplado com o sorteio.
Lá foi ele. Tirou a moto zerada, vermelha reluzente. Ria de orelha a orelha. Resolveu estrear o prêmio logo. Pegou o cachorro, colocou na coleira e foi devagarinho para que ele pudesse acompanhá-lo. A sorte naquele tempo é que trânsito era coisa só de São Paulo em dia de feriado, BH vivia dias tranquilos. Mas ele viu que o bichinho sofria e arrumou um jeito de colocá-lo na garupa. Quando chegou em casa a comida estava tão gostosa, a cama tão aconchegante e os familiares tão carinhos que ele pensou: “Já tenho minha motoca e a terra de Moeda pode me dar tudo, vou mexer com voltar para Belo Horizonte não”.
Até voltou, mas só para acertar, pedir conta. Voltou para Moeda satisfeito, convencido de que já tinha conseguido muito e lá era seu lugar. Três anos depois, chegaram três homens na propriedade que ele arava para pedir satisfação sobre a moto, diziam que ele não havia pagado e ele crente de que a moto era um prêmio.
– Uai, me falaram que fui sorteado e tenho que pagar? Tem nada disso não, cê bobo sô.
Zé da Cruz estava tão convicto que a moto era de seu direito que depois de um tempo os caras quase desistiram. Como o Zé estava cansado daquela discussão e da Moeda nunca mais sairia, decidiu entregar, afinal, podia muito bem andar por ali com os próprios pés, a cavalo e carona, era tudo pertinho.
– Pô levá, num guento mais falatório.
E os homens levaram o que o Zé achava ser um prêmio, ninguém o convenceu de que a motoca teria que ser paga por ele. Mas de uma coisa ele estava certo, Zé da Cruz tinha que ficar em Moeda, conhecia ali como ninguém. E o povo reconhecia isso, ele até entrou para a política e foi o vereador mais votado até hoje. Os discursos? Quem o teve como colega na Câmara garante que eram bem articulados, de quem conhecia muito bem a realidade de Moeda e seu povo. Ele estava certo o tempo todo: ali era seu lugar e não na Capital.