Viajar na maionese é preciso
De vez em quando vou para longe. Só quem vive no mundo dos pensamentos me encontra. É que escrever é amplo, um texto surge de uma conversa, de uma lembrança, no banho, na rua… Sentar para redigir é um detalhe, as frases e até parágrafos inteiros são rascunhados na minha mente com horas, dias, semanas de antecedência. De vez em quando, estes rascunhos até roubam preciosas horas de sono e enquanto a ideia não se completa as palavras não dão paz ao meu sossego.
É por isso que deixo amigos que criam viajarem tranquilamente. Às vezes a prosa fica entrecortada, mas tenho certeza de que uma obra começa a ser criada ali. Criar é muito mais do que estar no atelier, no escritório. Um poema ou um quadro se fazem de viagens na maionese, de viagens na própria rua ou para outro país. Uma escultura é criada com o que passou, o que se vive, o que virá. O trabalho do artista, ao contrário do que pensam, nunca tem fim. A vida e tudo que acontece com ela é matéria-prima e há de se compreender porque quem cria mesmo parado está em movimento.
O foco de quem cria vai além do óbvio, mostra de formas bonitas uma verdade nua e crua ou o que antes parecia trivial, sem graça. E como dizia um carinha aí, “O que não existe é muito importante”. É ao viajar na maionese, ao embarcar em uma pintura ou canção que penso sobre sentimentos, sobre a vida, o que parece não existir quando todo tempo é contado para correr atrás de tudo que o dinheiro compra.
O que dizem livros de realismo fantástico parece não ter sentido para quem não pensa no que é fundamental e não se vê, uma escultura é pura invenção para aquele que pouco entende da necessária arte de viajar na maionese. Eu ainda prefiro sair de mim na velocidade da luz e desembarcar onde só eu sei navegar, quando volto à realidade entendo melhor quem está atracado na dura realidade.