A noiva que nunca teve noite de núpcias
Ibitira foi diferente até pra começar a existir. Em vez de surgir em volta de uma igreja com pracinha, regra das cidades mineiras, apareceu depois que o trem chegou. Foi ao lado da Maria Fumaça que muitas lendas surgiram, até a de como a cidade(recuso chamá-la de distrito) ganhou 0 nome que tem, mas essa é outra história que já contei aqui. O fato é que o trem levava e trazia muita gente, além de coisas, pra tudo em quanto é lugar, inclusive para casar em Martinho Campos ou até Leandro Ferreira, por causa de um certo padre Libério. Lá demorou um pouquinho mais a ter igreja própria, porém os amores só se consumavam depois da bênção de Deus, dizem.
Eis que nessas viagens casadoiras, o noivo ia em um vagão diferente da futura esposa, tudo para manter o mistério sobre o vestido, além de dar sorte. Na volta, logo depois que chovia arroz, havia uma tradição divertida. O maquinista conduzia a Maria Fumaça bem devagar e todos os homens corriam ao lado do trem para tomarem impulso e subirem no trem.
Acontece que um dia o noivo, Francisco, era o melhor amigo do maquinista, Osvaldo. E como vocês sabem, melhores amigos gostam de pregar essas peças que entram para a história. Daí que em vez diminuir o ritmo da locomotiva, Osvaldo aumentou, dava sinal e nada do amigo conseguir subir, até que a Maria Fumaça pegou um embalo tão grande que ficou difícil diminuir.
Os convidados todos estavam de volta ao trem, mas ele, ah, estava cansado demais dos preparativos para a vida de casado. Foi Francisco quem deu acabamento na casinha simples, mas feita com muito capricho. Com mãos boas, fez até parte dos móveis, mal conseguiu se aprontar para dizer o sim para a amada Maria Amélia quanto mais correr atrás do trem.
E olha que dizem que mineiro não perde trem. Perde mesmo não, ele era baiano, tinha chegado da Ibitira da Bahia na de Minas há pouco mais de um ano. Pra piorar, era a última viagem do dia. Ibitira ficava a 15 quilômetros dali e naquele breu ninguém passava na estrada poeirenta. O que lhe restou foi a estadia em um banco de praça em frente à matriz para aguardar o primeiro trem do dia seguinte.
Maria Amélia suspirou aliviada, disfarçadamente, pois estava aflita com a noite de núpcias. Noite que não aconteceu porque quando Francisco chegou fez questão de dizer não ao trabalho, pegou Maria nos braços, levou para fora da casinha, fingiu que chegaram juntos e com o pé direito entrou no novo lar. Fez da noiva mulher. Ela, no início, ficou nervosa, depois se perguntou porque tanto medo, se Francisco sabia lhe fazer feliz. Não cobriu a mulher só de beijos, mas de declarações e juras que foram levadas à sério durante uma longa vida juntos.
Foi assim o dia de núpcias do homem sacaneado pelo melhor amigo e da mulher que nunca fez de todas as horas a melhor para estar com o marido. O maquinista nunca mais pôs à prova a capacidade dos noivos de embarcarem no trem.
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