O compadre convincente

Joaquim nunca imaginou que deixaria Ibitira. Até que um dia recebeu uma proposta pra lá de boa, irrecusável. Partiria lucro em uma cidadezinha perto de Patos de Minas, nunca tinha ouvido falar de lá, mas a ideia de fazer um pé de meia apetecia. A renca de filhos e a esposa gostaram. Ele se despediu dos amigos da banda de música que tocava nas festas e dos companheiros do futebol. Deu aquela tristeza. E toda vez que pensava em chorar, lembrava de como a vida mudaria para melhor.

Arrumou a mudança e foi. Gostou demais da terrinha, bem menos vermelha do que a de Ibitira, mas tão fértil quanto. As vaquinhas também eram boas de leite. As meninas e meninos conseguiam estudar, uns arrumaram emprego e os outros ajudavam na roça. O patrão estava feliz. Joaquim tinha a mão boa pra terra e jeito com o gado. Maricota cozinhava bem demais, no dia de acerto era servido um banquete.

Todo mundo estava bem. De vez em quando Joca sentia umas pontadas no coração de saudades de Ibitira, elas vinham mais forte no domingo em que o futebol era sagrado e nos dias santos, quando a banda tocava nas festas religiosas.
E bem quando o coração apertou, Joca escutou umas palmas.

– Oh de casa!
Era uma voz conhecida, ibitirense.

O aperto afrouxou, as pontadas aos poucos deram lugar aos pulos de alegria do coração.
– Alonsooooo, oh compadre, vem cá, já vou pedir a Maricota pra fazer um café.

A mulher foi para o fogão e os dois amigos andaram por toda propriedade, depois sentaram-se à mesa. Maricota arrepiava até os cabelos da sobrancelha com a conversa.

– Cumpadi, cê faz falta demais. A banda tá precisando de um maestro, o time tá desfalcado. Arrumamos um jogador que num é nem metade docê.

– Fala isso não, Alonso. Eu sinto até umas pontadas no peito em dia de jogo e festa. Só que olho pra Maricota feliz, os meninos felizes, tá dando um lucrinho aqui.

– Mas na Bitira cê é dos mió fazendeiro, fazedô de queijo, dinheiro não há de faltar. E ainda tem as pontadas, cê pode ficar triste e até doente. Lá não.

Joca falou de pronto que não podia. Alonso foi embora e o deixou com um “cê que sabe”. Porém, foi só as pontadas virem que ele quase chorava ao pensar na banda e no time. Numa dessas, não aguentou.

–  Vamos embora, Maricota. Num tô suportando tanta pontada no peito e na ideia da banda, do time sem mim.

Nenhum argumento superou o do Alonso. E olha que ninguém da família queria voltar. Voltaram com a cara amarrada, testemunhando a alegria do Joca.

Nunca mais saiu de Ibitira, nem da banda. Só pendurou as chuteiras quando não tinha mais jeito. Criou a família ali e é lá que mesmo os filhos que foram para longe se reúnem e celebram tudo que passou na vida deles.

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Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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