O bom dia ibitirense
Quando me mudei de Ibitira, aos 15 anos, tive uma dificuldade peculiar. Em Divinópolis, as pessoas pouco se cumprimentavam e se falavam comigo era com um “bom dia, boa tarde, boa noite” acotovelando-se pelas ruas sem olhar direito para mim. E eu, com uma inocência interiorana, tentava ser gentil com o cumprimento que usei a vida inteira sem nada de resposta -“Oi, cê tá boa? ou Oi, cê tá bão?”. Lá pouco se usa os tradicionais cumprimentos da cidade grande. E mesmo que você nunca tenha posto os pés naquela terra vermelha, será cumprimentado, raramente com um bom dia.
Nem é de se espantar que saibam o nome de quem acabou de chegar. As notícias sobre quem é de fora correm rápido pelas ruas. Vira assunto fácil nos banquinhos que ficam em frente às calçadas das casas, nas praças, vendas…
Assim, em Divinópolis, quando menina vim para cá, me soava com muita formalidade o “bom dia”. E de fato é. O “oi, cê tá bão?” é carregado de interesse – de saber quem é você, se é forasteiro – ou de querer escutar uma resposta sincera de um velho conhecido.
A pergunta, em Ibitira, abre espaço para um desabafo pra quem mora lá. Conhece-se todo mundo, daí se “não tá bão ou boa” é só esticar a prosa, sentar na calçada, parar a bicicleta e contar porque o trem tá feio. Dá pra falar do que é bom da vida também, claro, daí é melhor ainda. Um simples “oi, cê tá bão?” pode acabar com um convite para tomar um café, cerveja ou pinga.
Saí de lá há 15 anos, e quase toda aquela gente me chama pelo nome. Inúmeras vezes eu não sei quem é, mas eu respondo com um sorriso no rosto. Pra mim escutar meu nome até hoje por lá é uma das formas de carinho mais gostosas, tem som de infância e felicidade, dessas alegrias à toa, pouco exigentes. Com o “oi, cê tá boa?” pode vir um “cê sumiu, uai” ou “cê é fia da Neuza do Julinho?”. Claro, pra confirmar o que já sabem.
O “bom dia” de Ibitira é convite ao diálogo. O bom dia da cidade é obrigação, educação também. É uma afirmação sem querer realmente saber como está o outro mesmo que venha acompanhado de um “tudo bem com você?”. Não dá tempo de explicar, a confiança é pouca. A resposta é sempre padrão, “tudo bem”. Em Ibitira nunca se sabe. Já ouvi pro “oi, cê tá bão?”: “tô em pé, né?”, “pelejando pra ficar bão”, “bão demais, cê tá sabendo que eu…” – e por aí vai.
O “bom dia” ibitirense é carinho. É resposta que não se cansa de ouvir. Eu gosto e fico feliz ao ser perguntada. É por isso que apesar de querer correr o mundo também desejo que sempre possa voltar para lá, esteja eu “boa” ou “pelejando pra melhorar”.