A ordem certa dos livros é a desordem

A ordem certa dos livros é a desordem

Estantes de livros existem para serem bagunçadas. A ordem correta de um clássico é ora em uma cabeceira, ora na bolsa e onde mais os leitores estiverem. Por isso, eu tenho certeza de que quando eu tiver filhos não vou brigar quando chegar em casa e ver meus mais queridos clássicos fora do lugar, especialmente se estiver nas mãos deles, no criado-mudo do quarto, porque o lugar certo é esse e não abandonado na estante. Como diz um famoso juramento: “Lugar de livro é na mão do leitor”. Ficarei brava é se eles se tornarem adultos que cresceram menos do que poderiam por não terem passado por páginas fascinantes.

 

Na estante, os livros amargam a solidão de não nutrir nenhuma mente. Ficam aflitos para dialogarem com histórias parecidas de quem os lê. Posso garantir até que a expressão “jogado às traças” surgiu por causa de livros que não respiram outro ar a não ser da estante do dono. Livro é rueiro, se entedia de ficar só, adoece e morre de um dos únicos males que as páginas podem sofrer, sufocados pelas traças. Pior que isso só ser assinado, queimado. Quando jogado no lixo ou deixado ao relento numa esquina, ainda há esperança, há quem possa enxergar no abandono uma história bonita.

E embora alguns livros demorem a voltar para minha estante, eu desconheço sensação literária  melhor do que saber que um clássico foi lido depois de ser folheado, primeiro, na minha casa. O conhecimento só cresce quando espalhado, não vou deixar que um livro sucumba por medo de nunca mais vê-lo. Um dia, eu creio, as pessoas vão entender que o gesto mais generoso é este empréstimo, que as fazem viajar e crescer. Daí, todos os livros serão devolvidos logo após a leitura, para continuarem a circular.

Eu monto minha estante como quem constrói um patrimônio. Faço questão que os que amo leiam o que li, principalmente futuros sobrinhos e filhos. Ao passar pelas páginas que passei tenho certeza que vão me entender e até serem um pouco mais parecidos comigo.

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

Oi, o que achou do texto de hoje?

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *