Caminho de pedras
Há alguns anos as lutas femininas só eram lembradas no 8 de março. De uns tempos para cá, sempre. Dia da Mulher agora parece ser cotidiano. São frequentes as notícias sobre as batalhas e conquistas das mulheres, além de ações por nós. Houve um tempo que, confesso, acreditei ser mais sensato um Dia do Humano e não da Mulher para nos colocar em pé de igualdade. Mas tenho ouvido e visto coisas que me mostram como estarmos em pauta diariamente é essencial.
A mais recente história que conheci é a da Dona Fatinha, lá de Cataguases. Ela era apedrejada quando começou a correr, 33 anos atrás. Os agressores perguntavam se ela não tinha o tanque cheio de roupa para lavar ou comida por fazer, correr não era “coisa de mulher”. Mas ela não parou por causa dos gritos machistas, continuou no esporte e conquistou o mundo. São milhares de troféus e medalhas que mostram isso, alguns de provas internacionais, além de uma vida mais sã por causa do atletismo. Fatinha ficou viúva duas vezes, perdeu um filho e atribui o bom psicológico ao esporte, como contou no Tô Indo, da TV Integração, programa em que conheci a corredora.
Você pode dizer que esse argumento não vale para justificar a necessidade do feminismo atualmente porque aconteceu há mais de 30 anos. Só que hoje, nas esquinas, nos pontos de ônibus, em empresas e até na família ouço comentários desrespeitosos sobre a mulher.
Em uma pesquisa da Avon e Data Folha quase 50% das pessoas disseram que é errado a mulher sair sem um homem (marido, namorado, familiar). E pasmem, foram entrevistados jovens com idades entre 16 e 24 anos. Isso sem falar em mais de um milhão de mulheres violentadas anualmente de acordo com o IBGE, eu conheço gente que faz parte das estatísticas, o que deixa o número mais doloroso, humano!
Quantas pedras há no caminho das mulheres! Mas não é só a Fatinha que não para em busca do que deseja quando alguém cisma de apedrejá-la. Conheço uma legião de corredoras que além de calarem os machistas ainda conseguem plantar flores nesse caminho de pedras. Semeiam esperanças e a certeza de que não precisamos de levantar a voz para vencer, mas de mostrar, todo dia, que somos mais fortes do que o machismo.
Sobre o texto:
Artigo feito especialmente para a revista Xeque Mate, publicação em que atuo desde 2014 como revisora e repórter.