A procura de uma companheira
Ela lamentou o fracasso do casamento e só pediu o divórcio quando tinha certeza de que conseguiria cuidar dos filhos. Ele viveu quase 40 anos ao lado da mesma mulher. Ela nunca mais se casou mesmo com a separação aos 30 e poucos, já chegava aos 70. Os dois estavam sozinhos e tinham a mesma idade, o que Golias, trocador de uma linha de ônibus que passava pelo sítio da jovem senhora, considerava suficiente para que um casal surgisse.
O cobrador observava Aurora sempre que ela ia à cidade comprar o que a terra não produzia. Também olhava Emídio que custava a dar um sorriso, fruto da viuvez. Virava e mexia ele entrava na lotação já na cidade, pois morava em um bairro bem perto da comunidade rural. Aurora nunca reclamava e estava sempre de bom-humor. O que preocupava Golias era o fato de ela morar sozinha e assistir a todos os noticiários policiais. Elegante e jovem, mas muito fechada em casa, precisava de um companheiro, era assim que Golias pensava.
Um dia, Aurora desceu do ônibus bem no ponto que Emídio entrou. Golias puxou a língua do viúvo. Começou de mansinho, disse que ele era jovem ainda, havia muitas senhoras como ele, solitárias e cheias de amor. O homem começou a se animar.
— Golias, até que pensar em arrumar uma mulher eu penso, mas fico com medo de cair em uma enrascada.
— Não seja por isso, seu Emídio. Eu tenho a companheira perfeita para o senhor. Da sua idade, bonita, prendada, cuida de um sítio sozinha!
E a conversa durou até que ele chegou ao ponto final, de tão empolgado. Ficou tudo acertado, no outro dia ele iria até a roça conhecer Aurora. Golias achou que dava tão certo que nem se preocupou em avisar a pretendida. Logo de manhã, no primeiro horário, ele entrou na lotação todo perfumado, com a roupa de domingo e até um cravo na lapela. Quando chegou perto do sítio, desceu, animado.
Pôs-se a chamar a pretendente. Ela subiu a rampa devagar, mas já abria o sorriso, era assim que ela atendia o portão. Crente de que venderia dúzias de ovo ou um frango, ela teve uma surpresa.
— Pois não, em que posso ajudá-lo?
— Procuro uma companheira, tô viúvo e sei que, como eu, a senhora é sozinha.
— Quem te falou isso?
— O Golias, trocador.
Neste momento, ela viu que o senhorzinho estava com uma mala também.
— O senhor tá de viagem? Vai para algum lugar?
— Pretendo ficar aqui para nos conhecermos melhor.
— Nos conhecer até podemos, só que meu marido tá chegando e você só pode entrar depois que ele chegar.
— O Golias disse que a senhora era sozinha!
— Ele te enganou. Meu marido é o ciúme em pessoa.
— Então como eu faço?
— Volta com o Golias para a cidade. Pode sentar lá na casinha do ponto, daqui a uma hora mais ou menos o ônibus passa.
Assim Emídio sentou no banco frio, a espera do ônibus. Aurora não podia acreditar que Golias queria estragar a solteirisse convicta dela. Homem pra quê? Era muito feliz com a vida que tinha. E sozinha ela não era, toda hora tinha que providenciar comida para alguma criação.
No entanto, quando Emídio já chorava, mais de raiva que de tristeza, uma outra senhora sentou-se no banco. Era Tereza, de pele tão branca quanto os cabelos. Ela sim queria um companheiro e ficou encantada com o senhor alto de olhos azuis. No ônibus, trataram logo de arrumar um lugar para os dois e ela passou a ir uma vez por semana encontrá-lo. Ele ia outra. Foi assim até que decidiu se mudar pra roça.
E um dia, logo no início, ele teve que chamar Aurora de novo. Ela subiu a rampa até o portão porque a visão não era nítida lá de baixo. Quando reconheceu Emídio, fechou a cara e começou a xingar. Ele logo se defendeu.
— Só quero uma dúzia de ovos para Tereza, nos juntamos.
Constrangida, a solteira foi até o galinheiro e pegou os ovos. E dessa forma todos foram felizes para sempre a sua maneira. Ela sozinha, ele e Tereza companheiros até hoje.