A primeira luta antimanicomial de Raul
Raul levantou-se cedo e embora a marcha da Luta Antimanicomial fosse à tarde, tirou o pijama e colocou a fantasia para a estreia dele no desfile. Deu uma voltinha pela vila, almoçou, tudo com a roupa que ele havia confeccionado com a menina que fez o convite para o desfile. Quando ela chegou admirou-se com a animação do senhorzinho.
— Nossa, que bonito o senhor está, agora só falta chamar o Eustáquio para ir conosco.
— Mas o Eustáquio fala português? Porque nunca entendo nada.
— Uai, eu acho que fala, pergunta pra ele.
E lá se foi Raul para convidar o vizinho para a luta.
— Eustáquio, eu não sei se você vai entender, falar você fala, né?
O homem balançou a cabeça.
— Eu acho que é grego. Se bem que grego eu sei falar, deve ser de uma região que o grego é mais difícil.
Avisou que estava na hora e se foi com ele e a menina.
Raul chegou à Praça da Liberdade para sua primeira luta antimanicomial e tinha muitas certezas, exclamações e interrogações dentro de si. Mas antes de qualquer pergunta, maravilhou-se com todas as cores da luta, amarelos, azuis, tons de branco, rosa e algumas tonalidades que ele achava nunca ter visto saltavam aos olhos dele.
— Quantas cores bonitas, algumas eu acho que nunca vi!
Depois ficou inquieto que só e mandou a primeira interrogação:
— Como é que os carros vão passar se a gente está aqui?
— Hoje a rua é nossa, Raul. Os carros a têm todo dia, é nossa vez – a menina respondia.
E seguia:
— Isto que é Carnaval? Tenho que me divertir pra nunca mais me darem choque na cabeça?
— Nossa arma é a alegria e não a cara fechada, choque ou proibições, entende?
— Que bom que tem jeito de batalhar pelo que a gente quer com sorrisos e música.
Raul que nunca tinha ido à marcha da Luta Antimanicomial nem à Carnaval sabia direitinho o sentido de tudo aquilo e como tantos outros acreditava que era preciso estar ali para ter uma vida mais feliz. Conversava com Eustáquio e mal deixava ele falar grego, quando dizia uma palavra falava que ainda bem que tinha estudado o idioma. Mas os dois se entendiam nas danças e nos cantos, eram só alegria.
Quando do alto do carro uma moça gritou “Somos todos loucos”, a menina que havia levada-o perguntou:
— Você é louco?
— Eu nem sei o que é isso.
Normalmente, do que ele não sabia, ele queria saber, só que as cores, a música e tanta alegria o absorveram de uma tal forma que pouco importava o resto, só queria saber de usar as armas que a menina disse que seriam contra os choques e proibições dos manicômios.