Toque
Talvez você não tenha percebido, pelo menos eu demorei a notar, o quanto um gesto bobo sinaliza bem o futuro de um relacionamento.
Sabe aquele momento em que você está com uma pessoa de que gosta e um dos dois tenta tocar os dedos do outro? A reação a esse ato diz tudo sobre os momentos que virão. Quando a coisa é correspondida ela passa despercebida. Os dedos se tocam, brincam, viram até mão dada. Porém, quando os dedos se afastam, quando os dedos se afastam…
O afastar dos dedos é um sintoma definitivo. Engraçado que ele não é como o abraço de homem, que separa pela imposição da distância. Não! É mais como uma barreira ao laço emotivo, não ao fraterno. É possível sobreviver sem o tocar dos dedos, mas é uma questão de tempo até a falência de múltiplos órgãos.
Basta você se lembrar do que aconteceu depois que alguém negou tocar seus dedos. Não se lembra? Eu conto!
Foi um constrangimento sobrenatural. A expressão “ficar cheio de dedos” nunca fez tanto sentido. A impressão é a de que levantou-se um muro ali. Foi criada uma barreira quase intransponível.Quanto tempo você ainda continuou em contato com pessoas de quem você recusou o toque? Ou que recusaram um toque seu?
O entrelaçar dos dedos assusta muito mais que o maior dos beijos cheio de lascívia. É impressionante como tocar a mão do outro é um gesto infinitamente mais íntimo que enrolar duas línguas dentro de uma boca.
E o tocar dos dedos é também um divisor. Ele sapara algumas categorias de pessoas. Separa as que estão bem consigo mesmos daqueles que estão desesperadas por contato. Porque tem disso também. Pra tocar os dedos é preciso de um tempo próprio – e ele é lento! A urgência do calor não combina com o tocar dos dedos, que é leve, doce, sutil.
Ele separa também quem está pronto para se entregar ao outro de quem não está. Quem ainda sofre com as próprias dúvidas e dilemas não consegue tocar os dedos, porque é como se o enlace amarrasse também as pontas do relacionamento – que se quer evitar.
A última categoria que o entrelaçar dos dedos afasta é a dos que se interessam só pelo efêmero. Dos que, sim, querem só a língua quente no pescoço e na orelha.
Isso, aliás, não é pecado nenhum. Buscar apenas pelo amor em seu formato mínimo é completamente legítimo, só não combina com quem quer entrelaçar os dedos!
Precisa ter coragem pra se balançar no precipício do toque dos dedos, porque o resultado pode ser mortal – ou sublime. Pode ser o salto pra uma queda intensa e dolorosa.
Ou pode ser o impulso pra um magnífico voo acompanhado. Tudo depende, como diz uma música do Troye Sivan, de “reach out and touch”, de alcançar e tocar.