Tudo por uma noite no forró

Tudo por uma noite no forró

Lá em Pitangui vive uma mocinha de mais ou menos 80. É a Zinha. O ritmo de vida desta jovenzinha é mais agitado do que o meu ,e como. A agenda é cheia: de quarta à domingo ela viaja, vai a todos os bailes da melhor idade da região.

O problema é que os filhos, também cheios de compromissos, não podem levá-la em todos os lugares que ela quer ir. Bem, este é um problema deles, não dela. Zinha não tem medo de pedir carona na beira da estrada, se aventura nos ônibus e até na garupa de mototaxistas. E foi exatamente a carona com desconhecidos e a garupa de moto que preocupou os filhos. Noêmia, a filha mais brava, proibiu a forrozeira de pegar moto táxi.

“Tá bem minha filha, prometo que não faço isso mais, só vou de ônibus ou com gente conhecida”.

Mas Zinha não manteve a palavra. Um dia depois da proibição ela chegou atrasada na rodoviária. Ah, perder o forró de Nova Serrana é que ela não ia. E tinha outra coisa, a mais velha da história era ela e não os filhos, eram eles que deviam respeitá-la. Assim ela foi, se protegeu com o capacete, agarrou-se na cintura do motoqueiro e ainda teve o cuidado de passar os óculos para o mototaxista.

Zinha dançou a noite toda e fez questão de contar na manhã seguinte como a festa tinha sido animada. Ninguém duvidou da palavra da mãe, que afirmou, jurou de pés juntos, que tinha pegado o último ônibus para Nova Serrana.

Na verdade, chegou o dia do revide. Zinha já havia escutado inúmeras mentirinhas dos filhos. A maioria, como a que ela tinha contado, era inocente, só para poder se divertir mais, ficar na rua, brincando. Porém, a verdade não esperou nem o jantar. A mentira tinha pernas tão curtas quanto os óculos dela. Junto com o mototaxista a verdade encontrou Noêmia, por acaso, na rua.
“Ei dona, a senhora é filha da Zinha?”, perguntou mesmo já sabendo a resposta.

“Sou sim, por quê?”

“Entrega, por favor, esses óculos pra ela. Esqueceu comigo ontem, quando levei ela no Forró de Nova Serrana”.

A filha teve uma conversa com a mãe, daquelas que começam com “Êh, mãe!”. Zinha fez carinha triste, de arrependida, jurou que nunca mais iria montar em uma garupa de moto. E se ela fez isso de novo, desta vez ela tomou mais cuidado, nunca mais esqueceu nada com motoristas desconhecidos ou com quem pilotava a moto. A certeza que tenho  é que ela continua, até hoje, a ir nos forrós e todas as outras festas com a mesma alegria de sempre, só não sei se de ônibus, carona ou moto.

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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