Família: irmãos em terra de filhos únicos

Família: irmãos em terra de filhos únicos

Domingo é o dia mais familiar da semana. No domingo o tempo parece esperar a mesa ser posta, os ponteiros diminuem o ritmo para uma história acontecer ou ser contada… Não que de segunda a sábado a família perca seu valor. Mas mesmo nos domingos que passo sem familiares, meu pensamento e coração ficam mais próximos dos meus.

E tenho gente demais para o pensamento dar conta: são duas avós, pai, dois irmãos, 12 tios, 20 primos, sem contar os agregados, a primaiada mais “distante”, as tias-avós, são tão amados quanto os outros. A conta é alta e se eu colocar os que se foram e permanecem comigo estoura os dígitos de qualquer calculadora.

E como será no futuro? Hoje parei para pensar no quanto as nossas árvores têm demorado a dar novos galhos, somos cada vez menos numerosos. Antigamente, a pessoa se casava e logo logo outras dez pessoas já surgiam. Hoje, leva tempo até que um novo fruto apareça. Meus filhos vão ter três tios e se meu cunhado e irmãos seguirem a lógica, no máximo uns nove primos, isso jogando a estimativa lá no alto, na esperança de cada um ter três rebentos.

Como ficarão os almoços de domingo, as festas, os feriados?  

Acredito que eu não verei a mesa muito vazia, mas não tarda tanto também, algumas décadas. Tenho medo do dia que seremos poucos e cada vez mais atarefados, sem um domingo para deixar as tarefas e se dedicar a família. Sem tios que contem piadas, crianças que fazem a alegria e companhia umas para as outras. Receio o dia em que pediremos uma comida pré-pronta, pois não aprende-se mais as tradicionais receitas familiares. Nem os cadernos devem ajudar, pois tudo está na internet. Talvez a família se reinvente, um número maior de agregados frequentem as casas, amigos sejam ainda mais bem-vindos.

De uma coisa estou certa. As mães vão começar a cobrança por um neto cada vez mais cedo. A minha já cobrava, algumas tias também se dizem ansiosas e têm respostas para quase todas as desculpas das filhas que adiam a maternidade.

Quando vem o anúncio de uma gravidez antes do casamento ninguém nem vê problema mais, as moças estão mais velhas, se fosse em outros tempos provavelmente estariam casadas e com muitos filhos. Ser avó hoje já não é fácil, imagine daqui a algumas décadas? Com uma exceção ou outra, o matrimônio, quando acontece, vem muito tarde, os herdeiros nem se fala.

Só que tenho uma esperança. Também vai chegar a hora que todos os recursos tecnológicos, todas as invencionices vão se esgotar como salvação da humanidade. Com cada vez menos gente de sangue que se ligue umas às outras, o homem enxergará no amor, na união, a única alternativa. Ou o mundo dá as mãos como uma enorme família ou se entrega a aniquilação. Prefiro ter fé de que o amor nos salvará. Irá nascer uma nova família, a família Terra. Só assim teremos irmãos, num mundo com espaço apenas para filhos únicos.

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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Você tem 5 comentários
  1. Caio José at 15:36

    Muito bacana a reflexão, o que nos leva crer que da destruição pode nascer uma tau paz, pois somente nos distanciando de um núcleo podemos cegar tão perto do abismo e olhar para trás, podendo ver todos aqueles que não são de sangue semelhante mas que podem ser tão seus irmãos quanto qualquer outro…

  2. A Doiis at 16:58

    É cada vez mais comum as pessoas casarem tarde e terem poucos filhos. Não valorizam muito esse aconchego que a família dá. Os domingos nunca serão os mesmo sem uma família pra compartilhar.

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