Desapego: a arte de deixar ir

Desapego: a arte de deixar ir

Tão necessário quanto desapegar das coisas é deixar as pessoas irem. Parece estranho falar em desapego das pessoas, pois o termo está nas propagandas de vendas de roupas, móveis ou quinquilharias usadas. Por isso, a impressão que se tem é que o desapego das pessoas significa um descarte depois que elas não parecem interessantes mais. Porém, amigos deixam de aparecer com tanta frequência, amores perdem a intensidade e até contatos profissionais mudam de rota, naturalmente, sem que eu tome a decisão de deixá-los ir eles se vão quer eu queira não. Daí começa o sofrimento: “as pessoas deveriam ficar para sempre na minha vida, gosto tanto de fulano por que de repente ele desapareceu? Fiz tanto por ele, que ingrato!”

É um curso fora do país, um emprego em outra cidade e no caso dos amores, outro amor ou um se sentimento que deixou de ser como era. As circunstâncias, pessoas e sentimentos mudam, a gente normalmente não aceita. O namoro há de ter salvação, o amigo tem que te visitar em todas as férias. Só que o relacionamento fica moribundo até findar, o amigo teve que visitar parentes em todo país ou resolver problemas nos dias de descanso. De repente, encontro o amigo por acaso no supermercado e se estou com raiva, trocamos perguntas e respostas prontas. Mas ninguém tem culpa de nada, é natural que as pessoas fiquem longe em algum momento ou até deixem de fazer parte do dia a dia na mesma cidade. E leva uma vida para entender, tem gente que nunca entende. Para alguns é como se tudo que fez pelo outro não tivesse valido a pena pelo simples fato de ele ir embora.

Só que todo mundo que passa por mim tem um papel, ensina algo, ajuda a evoluir e é fundamental. A vida tem fases, muitas, mas é cíclica, um momento posterior só é diferente pelo que aconteceu antes. As visões de mundo, as reações são compostas pela fala de um amigo, a atitude de um ex-amor… O desapego é da presença física, o que foi de certa forma fica, mais do que na memória.

Eu tenho profundas saudades de ex-colegas de trabalho, amigos que vejo pouco ou nada, só que sou grata, sei que eles fazem parte de mim. E o sentimento que tento cultivar é esse – de agradecimento, que só é possível quando desapego da presença constante.

Até mesmo para ter amigos eternos é preciso desapegar. Entender que ele tem aparecido pouco por causa de alguma tarefa ou distância e mesmo assim sentir-se amigo. Quem é desapegado entende que quando acontecer um reencontro tudo pode ser tão bom como antes. O apego à presença, a falta de aceitação que o outro se foi é mágoa, briga interna, frustação…

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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