Crise dos 30?

Crise dos 30?

Amanhecer com 30 não doeu nem me assombrou. Os 20 e tantos anos trataram de deixar tudo mais leve. Eles me apresentaram uma síntese do que eu esperava ver apenas aos 30, recém-chegados, mas que pareciam já estar por aqui há uns dois anos. Por isso, como meu amigo Gustavo Costa, estava ansiosa para a idade ficar redondinha, já me sentia bem mais trintona do que na casa dos 20.

Ostento os 30, bem mais do que meus 15 anos. O glamour das debutantes não fez parte da minha vida. Era uma adolescente bastante mal-resolvida.Foi pouco antes dessa idade que saí de casa, o que fez com que eu conhecesse a comida como válvula de escape para a ansiedade e nota vermelha em matemática por ter ido para um colégio puxado. Vi minha autoestima intelectual e física ir para o chão. Nem quis book de 15 anos. Cobrava-me ser boa até no que eu detestava, sofria com os comentários sobre meus dez quilos adquiridos, comecei a ir em dezenas de profissionais para corrigir “o problema”.

E o pior, desconhecia a palavra NÃO e fazia tudo que me diziam ser certo, mas que nem sempre era o que eu queria. Engolia sapos com uma facilidade incrível. Para os outros, parecia que eu saboreava um banquete com a carne exótica, mas vinha a indigestão depois.

NÃO entrou no meu vocabulário só bem perto dos 30, aprendi que posso comprar algumas brigas para fazer o que realmente quero e me conheci melhor.

Foi importante para meu crescimento ter uma adolescência complicada, o que não é privilégio meu.  Aconteceram coisas boas nesse período também, claro. Estudei em uma escola que valorizava conhecimentos além dos formais, pessoas que até hoje fazem parte da minha vida de uma forma muito especial, conheci a filosofia hippie bem de perto, o que me fez ser mais leve diante de todo resto. Mas convivia calada com uma bagunça grande dentro de mim.

Aos 30 os problemas não diminuíram, pelo contrário. No entanto, eu sei lutar mais pelo que quero, bato o pé quando acredito nas minhas ideias, escuto-me acima de tudo antes de ouvir qualquer pessoa. Mentiria se dissesse que os 20 e poucos não deixaram saudades. Foi uma fase muito divertida, sem boletos para pagar e fins de semana com disposição para me acabar na farra. Emagrecer era muito mais fácil, o metabolismo em ponto de bala, ah, esse eu queria de volta, viu? Não era magrinha, porém era só decidir que queria emagrecer e pronto – uma semana bastava para eliminar dois quilos. Também dou bem menos importância ao meu peso, me cuido, sem neuras, sei que há outras coisas que são mais preciosas do que a boa forma.

As experiências e consciência de que o corpo mudou me fizeram pegar mais firme na alimentação e exercícios. Simultaneamente, não sou escrava da balança mais. A felicidade às vezes é calórica. Hoje mesmo acordei e havia um doce em cima da mesa com uma cartinha do marido. O plano era um café fit e a única coisa que ficou magrinha foi o café em si, sem açúcar, delícia que só conheci por agora e julgava impossível de ser bom na adolescência.

30 sem crise? Seria hipocrisia. Em qualquer idade terei as crises, mas o que mudou com o tempo foi a maneira de lidar com elas, sem deixar que me desentenda com eu mesma.

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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