Como seu Alfredo desmascarou o adivinhão

Como seu Alfredo desmascarou o adivinhão

“Há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia”. É verdade, mas por não sabermos explicar tudo muita gente aproveita para enganar quem está a procura de respostas. É isto que um místico do interior mineiro fazia. As filas dobravam quarteirões para que ele dissesse a direção correta, se alguém teria chances de sobreviver a uma doença terrível, se estava com a pessoa certa. A fama se espalhou e até caravanas o povo fazia para escutá-lo.

Seu Alfredo conheceu-o em um dia de desespero. Um carneiro havia sumido da roça. Depois de olhar em todas as plantações, no curral e na casa sede do sítio, apelou para São Longuinho. O Santo não o atendeu de imediato. Alfredo tentou até dobrar a quantidade de pulos, sem sucesso ainda prometeu rezar um rosário quando encontrasse o carneiro. As horas passavam e nada de encontrá-lo. Quando conversou com o vizinho, veio a derradeira solução:

— Depois do rio, há uns cinco quilômetros daqui, na cidade, tem um homem que responsa. 

— Responsa? Quero isso não, quero é meu carneiro. 

— Sô, responsar é dizer onde o que perdemos tá, é tipo uma adivinhação e o homem nunca erra. 

Animado, Alfredo montou no lombo do pangaré. Ele só não desistiu da consulta com o adivinhador porque era a última cartada e o carneiro fazia falta, ele estava com as moedas contadas para o fim do mês. O fazendeiro gastou quase a tarde toda na fila e pensava que o carneiro só seria encontrado no outro dia, já que quando voltasse o sol já teria se escondido o caminho iria ficar na escuridão. Só que ele precisava de um Norte, senão nem no dia mais claro seria possível encontrar o carneiro.

Quando entrou na sala contou todo drama ao místico. O homem se concentrou uns minutinhos, ficou de cabeça baixa e depois disse:

— Seu Alfredo, eu tenho uma péssima notícia pro senhor. 

— Tem problema o lugar ser difícil de chegar não, eu vou lá pegar o carneiro. 

— Pois é, só que já virou comida, comeram seu carneiro. 

— Como assim? Meu carneiro é de ferro, ninguém come carneiro hidráulico, uma peça, né bico não, cumpade. Bem que nunca acreditei nesta história de adivinhão. 

E desmascarar místico fez seu Alfredo saiu da sala bravo, pediu o dinheiro de volta, contou pra todo mundo da fila enorme que dobrava quarteirões que rapidinho se transformou em gatos pingados a espera do místico. Ele saiu de lá descrente de tudo, principalmente do ser humano. Só que quando chegou em casa a mulher o surpreendeu:

— Benhê, achei o carneiro debaixo do pé de manga. Já falei procê não deixar nada fora do lugar. 

Depois do jantar, Alfredo deu alguns pulinhos e rezou um rosário. No fim da oração comentou com a mulher:

— É, em São Longuinho eu nunca perco a fé, este é dos “bão”. 

Escritor por Talita Camargos Veja todos os textos deste autor →

Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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