Brincadeira de criança que previa o futuro

Pular corda na minha infância era mais do que se distrair. A gente cantava uma música que, diziam, apontava com quem iríamos nos casar. Engraçado é que naquela época, lá pelos meus 7, 8 anos, eu falava que viveria pelo mundo, errante, sem ninguém. Talvez por isso meu esforço de pular fora e deixar que outra menina com vontade de saber as características do noivo entrasse na roda e pisasse na corda quando cantávamos era tão grande. Se pisasse na corda quando disséssemos loiro, o marido “seria” loiro; se moreno, “moreno”, e assim por diante.

A música era mais ou menos essa:

“Com quem, com quem
Que fulana vai se casar.
Loiro ,moreno, careca, cabeludo, sem dente, dentuço, rei, ladrão, polícia, capitão“.

Assim tínhamos pistas sobre o futuro marido. Mas eu queria sair de tia da brincadeira. No entanto, era das menos espertas para qualquer coisa que exigia esforço físico. Só que como mulher que pretendia ser a mais independente possível, me superava e ao contrário de quando jogava queimada, estava no hall das melhores. Ninguém podia comigo ao pular corda e me encantada o momento em que eu chamava quem estava de fora para pular. Por um instante, eu e a outra menina brincávamos juntas. E olha, quase morria de medo da parceira estragar minha performance, pois me garantia e sabia que diferente de mim a maioria queria casar; ou pelo menos não fazia tanta questão de sair da brincadeira sem errar.

Um capricho meu. Bem como andar no meio fio sem cair e nos passeios com linhas sem pisar nelas, pequenos preciosismos de quem se dava mal com os passos. Rainha dos tropeços, precisava mudar minha imagem perante a turma nem que fosse na brincadeira. Concentrada, eu conseguia me equilibrar e completar a música de pular, a brincadeira à la Mãe Dinah.

 

Sempre tive medo de previsões, de elas estragarem meus planos. Na minha cabeça estava tudo certo, tanto quanto dois e dois são cinco. Como eu não era lá essas coisas com matemática também, achava que meus cálculos estavam certos. Só que quase nada ocorreu como eu previa e talvez errar na corda tivesse apontado como meu marido seria. Ainda bem que mantive o suspense em um esforço grande, ser surpreendida pelo destino, foi uma das minhas maiores felicidades (na maioria das vezes). Saber sobre o que há de ser não é brincadeira de criança (nem de adulto) e só pode ser desvendado ao viver.

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Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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