Adulto tempo demais

Adulto tempo demais

A gente é adulto tempo demais – pelo menos por uns 40 anos – segundo o IBGE idosos somos a partir dos 60. E isto confunde muito a cabeça. A gente pensa que era pra ter mais respostas, mas são as dúvidas que tomam conta. Era pra ter mais ânimo, só sobra pro trabalho em algumas semanas e sábado vira dia de dormir ou pra mais trabalho. Era pra gente ter dinheiro, às vezes só cobre as despesas do mês. Que diabos de vida adulta é esta? Não foi assim que imaginei quando era criança e queria muito crescer.

Era pra eu estar na flor da idade, com ânimo de sair por aí nas minhas folgas, afinal não tem ninguém pra mandar em mim mais, o dinheiro é meu, trabalho, me dedico… Que ser esquisito me tornei. Ser bebê, criança e adolescente é mais rápido, definido e simples, para a maioria, pelo menos. Sabe-se o que vai mudar, as transformações são esperadas. Já na vida adulta tudo parece estranho, menos o que todo mundo fala (a parte ruim, sempre ressaltada).

Ser adulto é grande e longo demais, cansa. Por isso, gente grande deveria ser melhor estudada, há um milhão de fases até a velhice e na falta de uma justificativa melhor dizemos que estamos velhos pra tanta mudança. Todo mundo sente que dos 20 e poucos para os 20 e tantos há uma diferença enorme, comenta-se, porém ninguém aprofunda nisso, ficamos na superfície de crises existenciais. Daí vem a sensação de que estamos é velhos, daqueles que ficam piores com o tempo em vez de aprender com a experiência – uma baita injustiça, aliás, usar o termo, já que há tanta gente pra lá dos 60, 70, 80, 90 mais legal que tanto jovem.

“Que cara chato e desinteressante eu me tornei, não consigo ir a baladas, som alto me incomoda, preciso de sossego. Estou velho”. Não é em todos os casos, porém acontece do que era o máximo na adolescência e no início dos 20 ter perdido um pouco ou toda graça. No entanto, continuamos adultos, nomeamos como chatice e até velhice precoce quando ainda temos décadas para chegar à terceira idade. E bem, bons, legais: quem disse que ter mais de 60 é sinônimo de ser chato? Ainda mais hoje!

Na verdade, as transformações acontecem o tempo inteiro, só que livro nenhum, que eu conheça, fala sobre as mudanças bruscas, os altos e baixos dos adultos. E para piorar esquecemos que passamos a gostar de muita coisa também, adquirimos novos hábitos, hobbies. Mas a miopia, antes até de usar óculos, leva a ver só a pessoa chata que nos tornamos.  Eu acho que pelo menos pra quem via de longe a Talita de 20 e poucos e a Talita de agora há uma grande diferença. Estou menos excêntrica, como já me adjetivaram, com a cabeça aberta, mas não faço muito do que fazia antes. Penso mais, faço menos.

No entanto, quando vou a uma festa é pra ser intensa em cada minuto que estarei ali, aprendi a aproveitar de uma forma diferente. Também já passei da fase de achar que dou conta de tudo e isso me deixa bem leve, falo não com mais facilidade, considero fazer musculação por minha saúde, já que uma das mudanças físicas dos 20 e tantos é a perda de massa magra.

Sou menos pra ser mais em tudo. Só que crescer não é indolor. Crescer é muito mais solitário pra quem já é grande: quede mãe, pai, escola? Estão longe e há uma cobrança, da minha parte, de conseguir seguir da forma mais independente possível. Pode ser que ser adulto dure tanto tempo porque é difícil aprender autonomamente o que e como ser quando crescer. É questão pra gente grande. E a gente ainda tem a tarefa de ser apoio de crianças, adolescentes e idosos. Todos crescendo, e o adulto mais ainda – de uma forma caótica.

Eu demorei a curtir meu caos de dúvidas, descobertas, dores e delícias da vida adulta. Achei crescer depois do 20 e tantos muito chato por um tempo. Hoje eu enxergo melhor, medos também existiram antes, porém agora estou mais solitária. E a jornada é longa nesta vida de adulto, a maior de toda vida, o que veio antes já acabou e quando a velhice chegar será menos longa do que o tempo de gente crescida também. Cabe a mim fazer desta grande fase uma fase grande em felicidade e aprendizado também.

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Talita Camargos é jornalista e flerta com a literatura, procura inspiração em conversas de ônibus, flores, familiares e amigos. Idealizou o Texto do Dia e publicou nos 365 dias de 2015 neste blog como desafio pessoal.

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